Meu nome não importa,
sou uma incógnita para a sociedade, com meus trinta e poucos anos, em busca ainda de um sonho, sem mulher e nem filhos, preso em
um turbilhão de pensamentos inóspitos e sem nexo, minha mente está confusa, como um
deserto, muitas dunas, uma longa caminhada para lugar algum debaixo de um sol
escaldante e uma noite congelante, a vida me prega mais uma de suas peças, não
tenho mais nada a perder, me encontro a beira desse abismo, a noite está bem
escuras, ao meu redor encontro somente rochas calcárias, tão antigas quanto a
vida terrena, insuportável os olhares invisíveis me observando e julgando
aquele ato tão desprezível que é de perder algo que deveria dá continuidade,
mas cada um sabe de suas escolhas, cada um sabe o que está acontecendo na sua
mente, as sombras querem me sufocar, a noite é clareada com um leve brilho do
luar que se esconde por trás das nuvens, onde também me escondo por trás de uma
leve arrogância que me carece de desculpas pelo fim de uma busca.
Olho para baixo, tudo que
vejo é uma esfumaçante névoa que impede que meus olhos doloridos e cansados
possam enxergar o fundo desse foço. É com muito pesar que digo, preciso me
libertar desse mundo que dilacera de dentro para fora e de fora para dentro,
como se fossem milhares de navalhas rasgando minha carne crua.
Sou um homem desprezível,
incapaz de aceitar qualquer palavra amiga, considere a bondade alheia ou o deus
de outrem, porque aceitar? Nunca fui de aceitar ou concordar com credos de
populares, de uma santa igreja ou da desprezível ameaça de perecer no inferno,
onde o único mal que fiz em vida foi o de arcar com as consequências de perder
a única coisa mais valiosa que um homem como eu poderia ter, a vida, mas sou um
inútil, um infame preso pelo mal agouro de uma consciência irritante por querer
ser bom demais.
Novamente faço o mesmo movimento de olhar o abismo por outro ângulo e com um
simples gesto, me sento na beira, encurvo a perna e apoio com um dos braços, o
outro braço serve de amparo para o corpo, tudo que vejo são rochas, sombras,
nuvens, estrelas e um caminho sem volta, estava preso, confinado naquele lugar,
é doloroso pensar que só preciso de um passo, a minha disposição de me jogar lá
embaixo e deixar a gravidade resolver por mim o que por anos não tinha feito,
me atirado de cabeça com toda a força na vida que me cercava por suas formas e
cores, mas preferi me atrelar a sombras e sem movimento, quem sou eu afinal? É
uma pergunta difícil de responder, uma resposta sem fundamentos. Não sei
responder, não acho uma resposta, é tudo muito confuso. Nesse momento
conflituoso, me apoio de mal jeito e de supetão, um vento forte me empurra, talvez
esse fosse o estímulo que precisava, mas não foi eu, foi uma força maior que agiu
contra a minha liberdade de escolha e eu caí nesse abismo, não gritei, não
chorei, pelo contrário abri os braços, virei de bruços e sorri, estava
realizando um sonho e foi com aquela mesma intensidade de mudanças que percebi
algo, tudo não passara de um sonho bom, mas o desejo era real e refletia o que
estava acontecendo naquele momento, um teatro de sombras me arrodeava, não
passava de objetos inanimados, estagnados pelo tempo, a fumaça do cigarro ainda
estava aceso, por um momento achei que fosse queimar a ponta de meus dedos, o
vento do ventilador era bastante forte, mas naquela noite, o clima estava bastante
frio. Talvez minha máscara tivesse caído, era meu único rosto, o rosto de
sempre, precisava dele, então coloquei de volta, apaguei o cigarro e voltei a
dormir, buscar sonhar com esse reencontro, buscar sonhar com o abismo.